LETRAMENTO DIGITAL: ASPECTOS SOCIAIS E POSSIBILIDADES PEDAGÓGICAS - RESENHA

Autores

  • Jeffersson Dias DUARTE
  • Albina Pereira de Pinho SILVA

DOI:

https://doi.org/10.30681/relva.v3i1.1468

Resumo

COSCARELLI, Carla; RIBEIRO, Ana Elisa. Letramento digital: aspectos sociais e possibilidades pedagógicas. 3. ed. Belo Horizonte: Ceale: Autêntica, 2011.

 

Letramento digital: aspectos sociais e possibilidades pedagógicas é uma obra organizada que vem ao encontro das discussões sobre o uso das tecnologias da informação e comunicação (TICs) nas escolas. Foi organizado por Carla Viana Coscarelli e Ana Elisa Ribeiro, possui onze capítulos distribuídos a vários autores preocupados com a formação do professor e a inserção das tecnologias da informação e comunicação (TICs) nas práticas pedagógicas e compõe-se de 141 páginas, além de uma apresentação pelas próprias organizadoras e um prefácio por Luiz Antônio Marcuschi, que também é um dos colaboradores. Este livro faz parte da coleção Linguagem e Educação, uma parceria da editora Autêntica e o Centro de Alfabetização e Leitura (Ceale) da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais, para apresentação de resultados de pesquisa.

Na apresentação, as coordenadoras, interativamente, relembram o leitor de como os recursos da informática mudaram a nossa forma de ver o mundo, ressaltando a importância deles para potencializar a aprendizagem. Hoje se pode ter acesso a cursos superiores pelo computador usando uma das melhores ferramentas para o estudo, comunicação, pesquisa e lazer, que é a internet, no entanto, toda essa evolução depreende novos conhecimentos, que serão discutidos no decorrer dos capítulos, para que incluam todos os envolvidos nessa atual forma de letramento.

Entende-se, então, que os docentes precisam de atualização constante, repensar a sala de aula, refletir sobre os ambientes de ensino/aprendizagem, reconfigurar conceitos e práticas. Segundo as organizadoras, tudo isso é reflexo do momento em que muitos têm acesso a informação fora da escola, e por isso sentem-se desestimulados, uma vez que acabam partilhando conhecimentos antes não buscados por meio dos livros, porém também existem aqueles que não têm esse acesso, os “excluídos digitais”, que precisam dessa nova modalidade de interação para a aprendizagem, por isso a importância da inserção da tecnologia na escola, com vistas a repensar o ensino nas suas diversas possibilidades, ainda mais porque o meio digital ampliou e reconfigurou alguns gêneros e criou outros. Para as autoras, essa obra passa a ser importante para esse repensar das práticas do letramento que já são discutidas nas escolas, entender que elas podem ampliar o leque de possibilidades de contato com a escrita também em ambiente digital, daí a nomenclatura destinada a essa inserção do digital “letramento digital”, tema central desse livro que pretende através de seus ensaios, segundo Marcuschi, levantar discussões e propor caminhos aos educadores e aos interessados em entender a língua e esse letramento atual.

No primeiro capítulo intitulado Educação e sociedade da informação, João Thomaz Pereira ressalta que no contexto atual, o grande desafio da sociedade civil, educadores e escolas é combater a exclusão digital ou o analfabetismo digital. Colocar um aluno em frente a um computador não significa incluí-lo, para que haja inclusão é preciso que este tenha participação efetiva enquanto membro social dotado de direitos e deveres, do contrário é um excluído da cultura digital.

Segundo ele, faz parte da inclusão, tornar o aluno capaz de dominar a tecnologia da informação (computadores, softwares, internet, etc) de tal modo que consiga também produzir conhecimento. No Brasil e no mundo, muito se discute sobre a inclusão digital nas escolas, a começar pelos educadores que precisam estar inseridos nesse contexto e mudar suas práticas, principalmente, quando toda tecnologia digital com processamento está convergindo, mudando de formato. Agora tudo está se integrando, interligando, o celular com o computador, com o aparelho de TV, com o tablet, as informações podem ser compartilhadas e acessadas em qualquer um desses dispositivos; isso muda todas as práticas em todos os setores da sociedade e não percebemos porque fazemos parte desse contexto.

Fica evidente a responsabilidade e necessidade de o professor melhorar sua qualificação e formação, precisamos dessa atualização, pois segundo o autor isso também coloca em risco o desenvolvimento do país. As tentativas do Brasil na inserção dos professores e alunos no uso das tecnologias acontecem desde a TV Escola, uma vez que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação de 1996 (LDB) já previa a necessidade da alfabetização digital, porém, como tudo avança muito rápido nessa área, aquele programa, no formato apresentado, tornou-se obsoleto.

Toda a preocupação do autor quanto à exclusão digital é pertinente. Podemos citar, por exemplo, a quantidade de faculdades oferecendo o formato do ensino superior a distância, os muitos sites de cursos de atualização diversas, tudo digitalmente partilhado nas ferramentas tecnológicas e que são importantes recursos para potencializar a aprendizagem, o que só confirma a necessidade de que todos sejam incluídos na cultura digital, inclusive os professores.

O segundo capítulo intitulado Alfabetização e Letramento Digital foi escrito por Carla Viana Coscarelli que o inicia de forma inusitada, com a palavra ‘logon’, como se fosse entrar em rede, como se o texto fosse uma ferramenta digital como o computador, onde devemos antes de utilizá-lo digitar uma senha e finaliza intitulando a conclusão com a palavra ‘logoff’, que significa sair, desconectar, de forma que interage com o leitor ao inseri-lo no contexto do letramento digital.

A autora não pretende fazer apologia à informática, pois não é a solução de todos os problemas da educação, mas mostrar aos educadores que ela pode ser útil a escola e não pretende substituir o papel e a importância deles. Mesmo o professor que ainda não tem familiaridade com a tecnologia pode se apropriar dessa ferramenta para aprender com os alunos, porém é necessário também se interessar por ela e planejar antes de utilizar.

Viana ressalta, ainda, que a internet trouxe acesso àqueles que antes não tinham, o aluno pode por meio dela conhecer o que não conhecia, museus, galerias, parques, zoológicos, cidades do mundo inteiro, ouvir músicas, acessar livros e pesquisas e vários outros acessos que agora passam a ser alcançáveis. Tudo isso condiz com essa nova forma de letramento. Já a alfabetização está para a digitação e com a eminente substituição, do lápis e caneta pelo teclado, fica o questionamento de que as camadas populares ainda continuarão saindo da escola sem saber digitar ou até mesmo ler e escrever como mostram o Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB) e o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), pois o analfabetismo tem sido um fato corrente nas escolas públicas como cita a autora, por isso, nós professores precisamos criar formas de incluir nossos alunos na cultura dos letramentos digitais.

O ensino nas redes públicas e particulares está diferente quanto a evolução de desempenho médio em português e matemática. Isso preocupa, o que fazemos diferente é que nos limita a ficar no patamar em que estamos? O que a universidade e os centros de formação têm feito com os professores? Será que estão os preparando para essa nova realidade? É o que expõe a autora mediante os gráficos de avaliação do INEP/SAEB de 2003 que apresentou dados referentes à 4ª série do ensino fundamental. Não adianta repassar a culpa quando a necessidade exige fazer a revolução na educação e os recursos da informática e da telemática têm muito a contribuir para que isso aconteça.

Nos parágrafos subsequentes a autora reafirma a importância da inclusão dos recursos digitais da informática na vida do aluno. Ela cita meios e recursos para ensinar ao aluno sobre e-mail, uso de sites para meninos e meninas, a fim de promover à alfabetização tecnológica e apropriação dos letramentos digitais e, ao mesmo tempo, desenvolver o controle do mouse, além da noção de link, ícones, palavras sublinhadas. Ela evidencia, também, a importância do corretor ortográfico, muitas vezes tão discriminado pelos autores, e sugere alguns sites para visitação pelos professores. Finaliza com a sugestão de que é necessário que os professores se prepararem para operar com as tecnologias, não que seja expert, mas familiarize-se com o básico para utilizá-la.

O terceiro capítulo foi escrito por Cecília Goulart e intitula-se Letramento e novas tecnologias: questões para a prática pedagógica. Para a autora o objetivo desse artigo é aprofundar noções de letramento e investigação dos diferentes modos de ser letrado, por isso seu artigo conceitua alguns termos como, letramento, escrita, signos, enunciado e gênero do discurso.

A perspectiva bakhtiniana é ensejada no texto para elucidar que o diálogo é fundamental na concepção de linguagem, interação verbal realizada pela enunciação e enunciado e expõem-se as dificuldades que alguns alunos podem sentir diante de um enunciado que para o professor talvez não exista, posto que acredita que os alunos o estão acompanhando. Dadas as diferenças dos alunos na cultura, no grupo social, experiências, visões de mundo, é importante que o professor considere todas essas vozes e palavras e articule as referências que já se possui com novas referências. Segundo a autora, essa socialização é papel da escola.

Ela cita exemplos baseados em experiências de professores com seus enunciados em sala de aula para explicar sobre o discurso, mas é na segunda parte do texto e, em sua conclusão, que a autora mostra sua preocupação quanto as novas formas de letramento, uma preocupação viável, uma vez que pode ser mais uma maneira de excluir nossos alunos quando não recebem um suporte como bons laboratórios de informática com considerável acesso à internet e professores preocupados e voltados para a real significação que tem o letramento.

O capítulo 4 intitulado Alfabetização Digital: problematização do conceito e possíveis relações com a pedagogia e com a aprendizagem inicial do sistema de escrita, da autora Isabel Cristina A. da Silva Frade, debate melhor sobre a temática proposta na obra, pois discute a introdução da cultura digital na sociedade, suas problematizações e relações conceituais entre letramento digital e alfabetização digital. Primeiro, a autora faz algumas relações conceituações, tendo como principal referencial a autora Magda Soares, que discute sobre esses dois termos para melhor compreensão do leitor.

O próximo passo descrito no artigo é, entender como o computador entra nessa perspectiva do letramento digital, sabendo que a leitura e a escrita, feita anteriormente de várias formas, está em constante mudança. Os principais elementos responsáveis por essa mudança são as tecnologias que possibilitaram uma permanência maior, uma melhor duração da escrita para guardar e recuperar os dados. Essas transformações têm possibilitado um grande avanço do ensino e aprendizagem, aí está a maior contribuição do computador.

A autora continua com destaque na pedagogia escolar da alfabetização e uso das tecnologias para escrever/inscrever, traçando um panorama desde a escrita pelo lápis, a feita na máquina de escrever ao teclado do computador e os avanços que trouxeram para o uso pedagógico na aprendizagem, principalmente na alfabetização, restando a indagação de quais efeitos isso traria.

Quando ela aborda sobre as tecnologias digitais, alerta os leitores de que dentre os vários gestos de alfabetização é necessário apropriarmos da alfabetização digital, pois pode ser que mesmo sabendo escrever e ler, o aluno seja analfabeto digital. Não significa, porém, esquecer os outros gestos, mas realizar uma confluência entre eles. Para finalizar o capítulo, a autora discorre sobre as diferenças que a oralidade, imagem e escrita assumem na tela do computador, as interações entre elas, tudo está interligado para facilitar o acesso do aluno, principalmente o aprendiz iniciante e, simultaneamente, colaborar para melhoria de sua aprendizagem.

Educação e novas tecnologias: um olhar para além da técnica é o título do 5º capítulo, escrito por Otacílio José Ribeiro. Este texto reconhece a importância da tecnologia, para o autor ela é um instrumento de desenvolvimento que sugere novidades na organização, leitura e inserção na sociedade, sendo que em uma significativa aprendizagem é necessário que aliemos ou consideremos a multiplicidade tecnológica no processo educativo.

Otacílio expõe que em todas as mídias, a interatividade passa a ser o elemento mais importante, principalmente nesse mundo em rede, se ela não existe, não se alfabetiza e, consequentemente, a exclusão digital é causada. Nesse sentido, sugere que tomemos uma atitude ativa nas escolas e permeemos nossos planejamentos em torno da tecnologia, de forma a adaptá-los para a inserir.

A leitura se torna muito melhor quando o autor faz uma analogia entre um trecho literário e a tecnologia, explicitando que ela pode ser, a princípio, motivo de reflexão enquanto instrumento de domesticação do homem amedrontado quanto ao que é novo, podendo a considerar como mito. Por isso a tecnologia na escola não pode ser somente um instrumento do saber fazer ou de produtividade, é preciso mais do que isso desmistificá-la no processo educativo, para que garanta a identidade e autoestima humana para a libertação e não alienação, como instrumento de mediação centrados nos sujeitos e não na técnica.

O autor conclui seu artigo inferindo acerca da importância do homem como protagonista de suas próprias criações e, como criador, colocará a tecnologia, sua criatura, a serviço de um bem social que parte de uma realidade e não do que é virtual, que modifica o pensamento a partir da educação e interação.

O capítulo 6, A angústia da interface, do autor Antônio Zumpano, é conciso e aborda a preocupação entre o que é real e virtual no processo de interação, diálogo entre os interlocutores aqui descritos como as pessoas e as outras pessoas, ou as pessoas e a tecnologia. No processo de atualização, parte do virtual para o real, como cita o autor, uma semente é uma árvore em potencial, por isso virtual, a partir do momento em que é plantada passa do virtual para o real. A angústia consiste na espera dessa interação entre a máquina e o homem, a exemplo de um caixa eletrônico onde todos os processos são automatizados para que faça tal trabalho, sua interface não suporta o diálogo entre os interlocutores, nem um simples bom-dia, da mesma forma quando estamos frente a um computador. Os suportes mudam e a interface traz consigo a dificuldade de identificação do outro, de quem fala conosco e a incerteza da sua efetividade.

O artigo que compõe o capítulo 7, Contribuições das teorias pedagógicas de aprendizagem na transição do presencial para o virtual escrito por Renato Rocha Souza, consiste na apresentação de algumas pedagogias com características que suportam o perfil da aprendizagem em ambiente virtual, tão recorrida em nossos dias para atualização profissional, formação acadêmica e aprendizagem em comunidades virtuais.

O autor relaciona o aprendizado em espaços eletrônicos a aspectos como: socialização e colaboração, meio e contexto, construção e significado. A socialização é a interação dos pares, melhor delineado pelos interlocutores do ambiente virtual, uma vez que podem escolher os sujeitos dessa interação, já a colaboração se dá na construção de um modelo explícito de conhecimento em uma rede de cooperação entre esses sujeitos.

Segundo o autor, Vygotsky (1978) e Bandura (1971/77 apud KEARSLEY, 1994), conseguem reforçar os benefícios que têm a aprendizagem colaborativa por meio da interação social para desenvolvimento da cognição. O contexto em que os sujeitos constroem, para a aprendizagem, através dos meios eletrônicos em que estão inseridos facilita seu desenvolvimento e também o dos pares. O autor cita, portanto, para que entendamos como se dá a aprendizagem em função do contexto, a Teoria do Aprendizado Experimental de Carl Rogers e a Teoria do Aprendizado Situacional de Jean Lave.

Ele ainda correlaciona à aprendizagem significativa e colaborativa, cita os teóricos que ressaltam o aprendizado significativo, a exemplo de Ausubel e Jerome Bruner. Ausubel destaca que o aprendizado significativo acontece quando uma informação nova é adquirida por intermédio do esforço do aprendiz e ligada aos conhecimentos que esse já possui em sua estrutura cognitiva. Bruner concorda, em sua teoria construtivista, que o aprendizado requer do aprendiz a seleção e transformação de informações, construção de hipóteses e tomar decisões amparado em sua estrutura cognitiva. Para o referido autor, os estudantes, com a ajuda do professor, desvendar as premissas por si só.

Como conclusão do seu artigo, Souza ressalva que a aprendizagem no ambiente virtual, certamente contribui para a construção significativa de referenciais particulares e é inegavelmente importante que se possa determinar estratégias e práticas para o aumento da eficiência desse meio como suporte educacional.

Ler na tela – letramento e novos suportes de leitura e escrita é o capítulo 8, foi escrito por Ana Elisa Ribeiro, dividido por nove subtítulos que objetivam direcionar melhor os assuntos relacionados à leitura na tela. Primeiro, a autora faz um panorama sobre as tecnologias, principalmente a digital, o receio de alguns em usá-la e por isso a consideram como catástrofe; ao mesmo tempo, há o problema daqueles que a aceitam sem reflexão, porque a crença é de que salvarão o mundo, por esse motivo não é possível que as discussões prescindam de um ponto de vista histórico, porém, ele é necessário para que compreendamos melhor as tecnologias como o computador e a internet.

Nos demais subtítulos, a autora discursa sobre o papel da escrita no mundo e como ela tem se diferenciado com a busca de melhores materiais até chegar ao texto virtual, texto para a leitura na tela. A leitura também passou por essas mudanças, o objeto de ler, à medida que o suporte vai mudando, ela se adapta e determina ao leitor novas práticas. O leitor, então, adapta-se ao novo suporte e novo objeto de ler, de acordo com suas necessidades e uso. Esse mesmo leitor tem ao seu dispor a portabilidade desses suportes de leitura, podendo ser privada ou não, na tela do computador, em casa, como na tela de um notebook em outros lugares, também passa a utilizar de novos gêneros de escrita, por vezes híbridos, ou seja, a junção de algo conhecido com algo novo.

Os gêneros de texto, por sua vez, existem consoantes aos seus suportes e a cada momento exigem um leitor capaz de entender as várias possibilidades do texto, além de sua versatilidade para caminhar entre os vários suportes. É possível lembrar que todo suporte oferece, mesmo os novos, adequações de outros suportes, a exemplo da leitura virtual, o hipertexto já era utilizado nas enciclopédias. Todo texto em si pode conter hipertextos, mas nem sempre o serão, pois, para sê-lo devem ter como característica a não linearidade, tanto em meio impresso, quanto eletrônico, ao passo que todo hipertexto será um texto. Um exemplo que temos até hoje é o jornal, suas primeiras páginas são compostas de forma que antes da leitura propriamente dita, o leitor pode navegar entre os títulos das manchetes, número da página onde a encontrará, inclusive, pode escolher qual das notícias lhe interessará.

A autora finaliza o capítulo com a exposição da análise de sua pesquisa sobre o letramento em hipertexto, em que observou quatro usuários de computador, em dois sites, Folha de São Paulo e Hoje em dia. Ela notou que eles usavam o suporte digital de forma semelhante a do não digital, porém, além de empregar palavras usadas do vocabulário do hipertexto impresso, acrescenta-se a ele palavras do hipertexto em tela, indicando que um suporte pode ser continuado em outro meio e não perder seus traços no suporte novo. Conclui, ainda, que a escola pode ampliar as possibilidades de formação de leitores. Para tal, faz-se necessário que os professores estejam preparados para integrar as tecnologias em seu fazer docente, com vistas à formação de novos leitores capazes de a incluir em seu repertório.

O capítulo 9, intitulado Chat: E agor@? Novas Regras - nova escrita de autoria de Else Martins dos Santos dedica-se a análise da escrita on-line, principalmente, das interlocuções nos chats. Ela faz duras críticas quanto às pessoas que veem a língua como forma. Para ela, os alunos estão, sim, fazendo leituras e a cada dia interagindo mais com seus colegas, porém, as leituras não são a da literatura de prestígio, e sua interação por ser adequada a situação e suporte oferecido, usa de uma escrita diferente, às vezes, analisadas negativamente por alguns, mas que para ela, não constituem um problema.

O problema, para autora, está em torno da afirmativa de que o computador prejudica a qualidade da escrita. Por esse motivo, busca por meio de teorias, como a de Marcuschi (2001) sobre o continuum dos gêneros e suas imbricações, explicar a relação fala e escrita dentro dos chats, ferramenta de interação on-line. Após, lança mão dos pressupostos do círculo de Bakhtin (2002) e Bronckart (1999) para entender que todas essas produções textuais são instâncias enunciativas dialógicas, pois orientam-se a um destinatário. Para ela o chat constitui-se de interações em situações dialogais e polilogais, pois demandam mais de um interlocutor na conversação por escrito em meio eletrônico.

Ainda em seu artigo são citadas como resultado de pesquisa relacionada ao chat, as características que este contém: o corte de palavras, abreviaturas, emoticons, onomatopeias, gírias e excesso de pontuação; tudo isso exemplificado através de tabelas ilustrando-as, o que toma a maior parte do artigo. Essas características fazem a comunicação por esse meio ser informal, na realidade há essa intencionalidade por parte dos adolescentes.

Além da pesquisa em torno do chat, a autora expõe uma proposta que fez aos colegas de trabalho de uma escola particular. Deveriam pedir aos alunos, produções de bilhetes e cartas de avaliação da disciplina, a fim de analisar como eles escreveriam para outro professor que não de português. O objetivo era saber se a escrita, em meios eletrônicos, influenciou no resultado da produção, no modo como se utilizaram das palavras. Para o bilhete, notou-se uma linguagem informal, semelhante à do chat, o que muda é o suporte. Já as cartas para o professor de Física revelam um aluno bastante cuidadoso com suas escolhas lexicais, dentro dos padrões formais, assim como para o professor de Educação Física, que apesar da descontração própria da disciplina, não deixou de seguir os padrões exigidos pelo gênero. Na disciplina História, também não se observou traços de linguagem dos chats e sim português escrito culto.

Concluiu-se, então, que os adolescentes pesquisados souberam adequar sua linguagem, de acordo com o gênero solicitado, por isso o chat não influencia, segundo a autora, a linguagem escrita, pelo contrário, demonstra alguém que busca a liberdade de expressão, porque mescla duas modalidades da língua, a fala e a escrita. É importante, portanto, que os professores possam utilizar dessas ferramentas de pesquisa, desassociando o que se fala daquilo que realmente se pode comprovar. Antes de agir com preconceito mediante as novas tecnologias, porque não as usá-las para uma melhoria na aprendizagem?

O capítulo 10, A coerência no hipertexto do autor Luiz Antônio Marcuschi é um ensaio que procura entender como se dá a coerência no hipertexto baseado na afirmativa de que ela fica por conta do leitor (navegador), pois não há e não é como no texto escrito ou falado. O leitor, em qualquer texto, não só no hipertexto, é que se movimenta para construir sentido, além dessa afirmativa tida como resposta ao problema da organicidade textual que, leva a sua interpretação, o autor tem como objetivo mostrar ao leitor, com uma linguagem de fácil acesso, que há mais em jogo ao que espera o leitor, quando se fala em hipertexto.

Segundo Marcuschi, a visão tradicional de um texto linear, nos dias atuais, pode ser um equívoco se pensarmos nos recentes estudos a respeito da escrita e leitura. Olhando a nossa volta, tudo nos leva ao texto, para isso o autor cita vários exemplos, e todos são basicamente não lineares, o que fortalece o conceito de hipertexto, apesar de que este, às vezes, até pode ser linear.

Ao olhar do leitor, a leitura de uma obra impressa é diferente de uma leitura hipertextual. As dinâmicas são seletivas para a impressa, como indicações nas notas de rodapé, ao passo que na leitura hipertextual, uma página, um artigo, um livro virtual (e-book), pode sobrepor a minha página principal de leitura, de modo que isso a torna mais inclusiva, porém pode também ser similar quanto ao papel do leitor, esse não muda. Para o autor os dois formatos de leitura podem oferecer possibilidades de inclusão ou exclusão, depende das estratégias do leitor e não do texto.

Para melhor explanação, Marcuschi expõe, ainda, as noções de texto e coerência, de como eram conceituados e como são agora, além da relação entre eles. Verifica-se que o hipertexto se encaixa perfeitamente nas noções textuais dadas pelas novas teorias e que a coerência dentro dele, tem mais a ver com leitor ao próprio hipertexto, é certo que se exige um leitor preparado, esforçado, pois tudo dependerá da familiaridade que este tem com o texto. Não há porque se preocupar, nem agir como se o hipertexto fosse algo totalmente destoado dos conhecimentos sobre o texto que já adquirimos, pois não há diferença, a não ser a exigência por parte de um leitor maior adaptado as significações que dará, conforme as pistas que provocará através dos links, para uso de sua cognição na constituição do sentido do texto.

O capítulo 11, Ensino / Aprendizagem da escrita e tecnologia digital: o e-mail como objeto de estudo e de trabalho em sala de aula, de Juliana Alves Assis, objetiva analisar as características do gênero e-mail e sua contribuição como instrumento tecnológico que se torna excelente ferramenta na estratégia pedagógica para a prática da escrita escolar. Ela aborda os desafios a serem enfrentados na aprendizagem da escrita e a relação fala e escrita segundo crenças e consequências, para que o leitor entenda as dificuldades que a própria escola cria no ensino da prática textual. Faz parte de seu aporte teórico, Luiz Antônio Marcuschi, que para ela decifra melhor as relações fala e escrita como modalidades de uso da língua. Só então, a autora delimita sua temática e insere o e-mail através de breve conceituação e após descrição de suas características formais, próprias do gênero, reconhece como melhor caminho para construir conhecimentos sobre a relação fala e escrita, encontra-se nas atividades comunicativas, resultado da necessidade social de interação, ainda mais visível com as inovações tecnológicas.

Após demonstrar em seu texto resultado de uma análise de 110 e-mails do trabalho de Assis (2002), a autora chega à conclusão de que esse gênero pode levar a percepção de algumas tendências, devendo o professor considerar seu aspecto material, advindo de sua variada organização estrutural e estratégias textuais. Observa-se que ele pode organizar-se como carta, partindo da configuração que assume, a estrutura em que é apresentado, a especificação do assunto, nome do remetente, expressões que manifestam o ponto de vista do produtor, referências do propósito do e-mail; outras características como uso de emoticons, erros de digitação, abreviaturas e siglas, mudança de linha, uso de post script, tamanho, que podem fornecer ao professor, grandes quantidades de dados para o fazer repensar sua metodologia quanto ao ensino da prática textual e crenças sobre a escrita e seu uso efetivo. É necessário que, como diz a autora, tenhamos o compromisso com a aprendizagem dos cidadãos, tomando como objeto de ensino, textos que componham seu universo das práticas discursivas, tornando próximos da realidade e necessidade, tanto presente, quanto futura.

Enfim, os capítulos enfatizam a necessidade de que todos os agentes do letramento, e nessa perspectiva, os professores, os órgãos de formação continuada, a universidade e a própria escola, estejam preparados para lidar com a tecnologia. Os avanços tecnológicos são tão rápidos que muitos preferem não saber, para justificar a sua falta de conhecimento e manter as aulas como sempre as mantiveram, por isso torna-se impossível utilizar de um computador para uma aula diferenciada, que chame a atenção do aluno para o verdadeiro sentido do aprender. Deixar os alunos sem acesso a esse avanço, acaba por excluí-los de sua realidade, dificultando o seu futuro profissional e pessoal cada vez mais inacessível sem as ferramentas digitais.

O letramento digital, temática central dessa obra, ainda precisa ser mais debatido. A obra é mais uma ferramenta que procura elucidar o questionamento a respeito do uso da escrita e da leitura nos meios digitais, visto que elas tomam uma nova forma e a relação de dependência entre o leitor e o suporte eletrônico aumentou ainda mais, fazendo com que interaja continuadamente com os variados textos e hipertextos. Certamente, os autores, por meio de suas pesquisas, conseguiram compreender a importância de introduzir a informática na vida dos alunos e passam ao leitor suas aspirações, balizadas pelas teorias, de como este poderá se adaptar ao uso da tecnologia para melhoria do ensino/aprendizagem.

Portanto, essa é uma obra recomendada a todos os profissionais docentes que buscam ampliar seus conhecimentos sobre a temática, é um excelente referencial para pesquisas sobre letramento, visto que reúne uma gama de autores preocupados e engajados na descoberta de novas respostas ou de novos questionamentos, a fim de colaborar com o aprimoramento e melhoria da qualidade social da educação.

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Publicado

2016-10-05

Como Citar

DUARTE, J. D., & SILVA, A. P. de P. (2016). LETRAMENTO DIGITAL: ASPECTOS SOCIAIS E POSSIBILIDADES PEDAGÓGICAS - RESENHA. Revista De Educação Do Vale Do Arinos - RELVA, 3(1). https://doi.org/10.30681/relva.v3i1.1468

Edição

Seção

ARTIGOS

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