Do corpo que desenha àquele que escreve: efeitos na elaboração intelectual de um pesquisador
DOI:
https://doi.org/10.30681/moinhos.vi14.13858Palavras-chave:
escrita; corpo; orientação acadêmica.Resumo
Este trabalho busca responder à seguinte questão de pesquisa: que efeitos os desenhos ou esquemas, feitos por um orientador de mestrado durante reuniões de orientação, podem causar na escrita de um pesquisador em formação? Tem como objetivo analisar como a implicação do corpo do orientador, ao fazer desenhos relacionados à pergunta de pesquisa de uma de suas orientandas, foi essencial para a constituição da escrita de uma dissertação. O dossiê analisado consiste prioritariamente de rascunhos de textos não publicados que compuseram o processo de escrita da dissertação de uma participante nomeada como Bridget. Nesse material, encontram-se uma série de desenhos feitos pela orientadora para explicar conceitos ou elaborações teóricas e de análise dos dados que, na sua avaliação, seriam entendidos mais facilmente se fossem feitas via o recurso do imaginário (Lacan, 1957-1958). Tais recursos gráficos mostram formas que ilustram a teoria ou a análise de dados que estava sendo discutida pela mestranda. Sabemos que investigar a respeito do papel que o desenho pode exercer para o homem significa retomar uma relação entre ambos que é bem antiga. Pensando na história da escrita, sabemos que ela nasceu dos desenhos feitos, por nossos antepassados, em cavernas. Com o passar dos anos, passou-se da escrita pictográfica para a alfabética. Assim, por detrás de cada letra, houve um desenho que a precedeu. Nossa hipótese, portanto, a partir da elaboração de Pommier (1993), é a de que processo análogo pode ocorrer ao longo da escrita de uma dissertação de mestrado. Quando faltam palavras, modos de simbolizar, o desenho pode ser um importante recurso pedagógico para colaborar com a elaboração do pensamento intelectual. A análise do dossiê de Bridget mostrou que os desenhos feitos pela orientadora tinham duas finalidades: 1) explicar, pela primeira vez, alguma discussão teórica; e 2) quebrar um preconceito muito forte (uma ideia fixa sem comprovação por meio dos dados) que impedia a pesquisadora de fazer distinções necessárias para o andamento da pesquisa. Ao analisar os traçados feitos pela orientadora, pensamos que eles mostram um modo acadêmico (e amoroso) de transmissão do saber. Por outro lado, indiciam um agente poderoso no que tange à implicação do corpo (Riolfi, 2003) do pesquisador no próprio processo de escrita.
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