JANAIR E SUA PAIXÃO: ECOS DA CONDIÇÃO NEGRA EM A PAIXÃO SEGUNDO G.H., DE CLARICE LISPECTOR
Resumo
O artigo atém-se à relação entre Janair e G.H., personagens do romance A paixão segundo G.H., de Clarice Lispector, considerando a lógica de embate entre classes sociais distintas. Para tanto, focaliza-se mais detidamente a personagem Janair, que se constrói enquanto signo do oprimido dentro da
obra, através de sua caracterização, bem como de sua posição subalterna na relação entre patroa e empregada. Por essas referências são revelados sentidos sociais fundamentais à diegese, ligados de maneira indissociável a processos históricos significativos na produção da desigual e excludente sociedade brasileira. Persegue-se, como elemento de interpretação, a questão racial que se avulta no texto e se consolida como aspecto fundante da personalidade de Janair, na qual se imbricam a animalização das características físicas próprias da população afro-brasileira, a reificação da trabalhadora doméstica, o silenciamento da mulher negra em tal condição e a vida precária a que está sujeita quando obrigada a morar no local de trabalho. A presente análise, ao esquadrinhar a situação de Janair, espera contribuir com um novo olhar sobre a obra de Clarice, despindo-a da suposta alienação que lhe é comumente atribuída, apontando caminhos que podem ser trilhados na tentativa de melhorar a compreensão de seu trabalho.